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Prevenção contra a malária ameaçada
28/12/2012
Prevenção contra a malária ameaçada
Instituto alerta para falhas no controle da transmissão da doença na África, continente com a maioria das mortes pelo mal infeccioso. Um dos entraves é o aumento da resistência dos mosquitos aos inseticidas
Paloma Oliveto
Sem vacina disponível para combatê-la, a malária continua matando 655 mil pessoas todos os anos - 80% delas só na África. Agora, um estudo da organização francesa Instituto de Pesquisa para o Desenvolvimento (IRD) alerta que o problema pode ficar maior no continente: as principais ações preventivas recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) estão perdendo o efeito devido ao potencial de adaptação do mosquito transmissor. No Benin, país localizado na região subsaariana, os dois principais vetores já não são mais alvo do piretroide, grupo de inseticidas que, normalmente, atacam o sistema nervoso do inseto, diminuindo os riscos de contaminação em humanos.
As principais diretrizes do Programa Global de Malária da OMS incluem a distribuição em larga escala de mosquiteiros impregnados com a substância, além da pulverização sazonal das paredes e dos muros das casas. Entre 2008 e 2010, 290 milhões de mosquiteiros foram distribuídos na África Subsaariana, o suficiente para proteger 580 milhões de pessoas. Ao mesmo tempo, 81 milhões, o equivalente a 11% da população em risco na região, tiveram as casas blindadas pelo inseticida. Para medir a eficácia dessas medidas, uma equipe de pesquisadores do IRD conduziu um estudo clínico em quase 30 cidades do Benin, que foram acompanhadas ao longo de 18 meses. Os resultados não se mostraram animadores.
Dos 58 vilarejos do país onde existem indícios de resistência ao inseticida, 28 foram escolhidos aleatoriamente. Nesses locais, os pesquisadores distribuíram mosquiteiros e pulverizaram casas onde havia gestantes e crianças com menos de 6 anos. A cada seis semanas, eram feitos exames clínicos nos participantes, além de testes de detecção do mosquito nas redes com inseticida. No total, 429 crianças foram acompanhadas em um ano e meio de pesquisa. "Nenhum benefício significativo para a redução da morbidade, da infecção e da transmissão da malária foi detectado", conta Vincent Corbel, pesquisador do IRD e professor do Departamento de Entomologia da Universidade de Kasetsart, na Tailândia (leia entrevista).
Os cientistas do IRD também constataram que o número de mosquitos com a mutação chamada kdr, que confere resistência aos inseticidas, cresceu no período do estudo, passando de 20% a 75%. De acordo com Corbel, o tipo de parede das casas, feitas de barro, pode ter diminuído a eficácia do spray, pois superfícies porosas absorvem o inseticida muito rapidamente. Contudo, ele afirma que não há como ignorar o fato de os vetores se adaptarem cada vez mais ao veneno. "O desenvolvimento da resistência aos inseticidas está se tornando uma séria ameaça à eficácia das medidas de controle dos vetores. Recentemente, foi estabelecida uma clara relação entre a resistência ao piretroide causado pela mutação kdr e o fracasso da adoção dos mosquiteiros e da pulverização das casas no sul de Benin. Mas não é só lá. Na última década, casos de resistência foram reportados em muitos países africanos, incluindo Quênia, Costa do Marfim, Nigéria, Burkina Faso, Mali, Níger, África do Sul e Camarões", observa Anges W. Yadouleton, pesquisador do Centro de Pesquisa Entomológica de Cotonou, no Benin.
Apenas o Anopheles gambiae mostrou, até hoje, capacidade de adaptação genética. O problema é que o outro vetor, o Anopheles funestus, aprendeu a contornar o inimigo, simplesmente mudando seus hábitos. "Durante o estudo, observamos que esse mosquito, que é o principal vetor no Benin, passou a picar mais as pessoas no ambiente externo e/ou no começo da manhã um ano depois da distribuição dos mosquiteiros. Isso sugere que a adoção universal dessa tática induziu uma mudança nas preferências de ataque desse inseto", conta Vincent Corbel. "Essa modificação de comportamento é preocupante, pois os moradores da área costumam acordar ainda na madrugada para trabalhar nas colheitas e, nesses momentos, não estão protegidos pelos mosquiteiros. Eles podem estar em uma situação especial de risco, já que o contato com o vetor é significativamente maior", conta.
Para Corbel, a experiência em Benin deixa uma clara a mensagem de que é preciso investir mais em novas frentes de combate ao vetor. "Nossas descobertas são importantes para os programas de controle da malária e devem ajudar a construir novas estratégias, com maior custo-benefício", afirma. Atualmente, não há outras medidas comprovadamente eficazes disponíveis. As inovações, como lançar no ambiente mosquitos modificados geneticamente e buscar novas moléculas para a fabricação de repelentes, ainda estão em fase de testes.
Queda no Brasil
No Brasil, os casos de malária estão em queda. De acordo com o Ministério da Saúde, entre 2005 e 2011, as notificações caíram de 607,7 mil para 267 mil, redução de 56%. No mesmo período, também houve uma diminuição significativa de óbitos provocados pela doença: 70%. Quase 100% dos casos de malária se concentram na região Amazônica.
Fonte: Cofen.com
Imagem: Cofen.com