Prazer e vício
25/07/2012
"Prazer e vício
Enquanto você começa a ler as primeiras linhas desta reportagem, existe uma grande chance de Augusto Henrique Carvalho de Melo, 32 anos, estar sentado no sofá de sua casa, diante de um televisor e com um joystick nas mãos. Atari, Master System, Nintendinho, Mega Drive, Sega Saturn, Dream Cast, PlayStation 1, PlayStation 2, Xbox 1, Xbox 360, Nintendo 64 e Nintendo DS tornaram-se amigos inseparáveis ao longo dos anos. Mais de 600 games, no formato de cartuchos ou CDs, passaram pelas suas mãos. A média de jogatina diária é de 12 a 14 horas, segundo o próprio.
Pesquisas realizadas nos Estados Unidos mostram que a dependência dos jogos eletrônicos é bastante similar ao uso abusivo de álcool ou o vício em chocolate. No Brasil, esses estudos começam a engatinhar. O ambulatório de psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo oferece tratamento para dependentes digitais, com foco em internet e games. De acordo com a Secretaria de Saúde de Pernambuco, o estado não possui tratamento especializado para esses casos. Mas uma pesquisa inédita, realizada com 200 alunos da UFPE que utilizaram jogos eletrônicos nos últimos 12 meses, mostrou que 42% jogaram por um período de tempo maior que o planejado.
Por isso, o Informática de hoje conta a história de Augusto. "Admito que sou viciado e sei que isso faz mal, assim como qualquer coisa em excesso", diz. Ao ser perguntado se já tentou ou pretende parar, responde na maior franqueza: "Honestamente, não. Eu gosto disso", afirma. A entrevista, que seria marcada para as 13h, foi adiada para 16h30. O motivo não foi trabalho. Por enquanto, Augusto está desempregado e faz bicos consertando computadores durante a semana. Uma parte do dinheiro vai para os jogos. Ele também estava estudando para prestar vestibular e ingressar em uma universidade, mas, por recomendação médica, deu uma pausa nos livros para cuidar da saúde.
No início daquela tarde, ele estava concentrado jogando Tony Hawk"s HD. Havia dormido de madrugada, às 2h, tentando zerar Dead Space 2 para Xbox 360 no modo difícil. Às 7h, acordou e começou a jogar antes mesmo do café. "Não tenho muito sono, durmo em média duas ou quatro horas por dia", explica.
O primeiro contato com o universo dos videogames foi aos 8 anos, quando herdou um Atari 2600 do tio. Ele revela que sempre jogou bastante e isso não afetou seu desempenho na escola. "Eu tirava boas notas, porque fazia o dever de casa logo e ficava com o tempo livre. Não sou antis-social, mas saio pouco. Quando era adolescente, pratiquei taekwondo e judô. Atualmente, faço natação três vezes por semana, até por uma questão de saúde", relata, tentando se desvencilhar do estereótipo de nerd.
Augusto lembra que, no começo, a mãe pedia para ele moderar o tempo gasto jogando. "Hoje, ela nem briga mais. O desconforto maior é quando estou com um jogo mais violento", comenta, acrescentando que não tem predileção por algum gênero ou estilo em específico.
"Algo que me deixa bastante irritado é quando preciso dar pause para atender o telefone ou dar algum recado. Só não me aborreço se for algo programado e combinado antes, como a natação. Meu recorde foram 48 horas seguidas no Master System. Nem lembro qual foi o jogo", conclui.
Perfil do jogador
Estudantes da graduação em psicologia da Universidade Federal de Pernambuco e da Universidade Católica de Pernambuco, coordenados pelo psicólogo Igor Lins Lemos, realizaram uma análise epidemiológica e sintomatológica do uso problemático de jogos eletrônicos. A pesquisa foi feita entre setembro e dezembro do ano passado e ouviu 200 estudantes da UFPE, de ambos os sexos, maiores de idade, de diversas áreas de ensino. Eles responderam nove perguntas de uma escala chamada Problem Video Game Playing (PVP). Todos tiveram contato com jogos eletrônicos nos últimos 12 meses.
A maioria dos jogadores pesquisados é homem - 68% 34,56% dos 136 homens entrevistados apresentaram uso problemático dos jogos eletrônicos
Entre as mulheres, o percentual foi de 21,88% 75,5% dos entrevistados afirmaram que precisaram continuar jogando porque perderam ou não alcançaram os resultados desejados 42% disseram que já tentaram parar de jogar, controlar ou diminuir o tempo gasto ou então jogaram por um período mais longo do que o planejado 76,5% dos participantes disseram ter feito pelo menos uma das seguintes coisas porque estavam jogando: deixar de comer, dormir tarde, passar menos tempo com amigos e família ou deixar de fazer lição de casa e trabalhos da faculdade."
Fonte: Diário de Pernambuco
Imagem: Folha Uol